Relação Especial de Poder
A relação especial de poder como conceito mais amplo,
prende-se com uma relação diferenciada entre o Estado e os seus subordinados, e
como essa relação é vinculada aos princípios, leis e comportamentos que
normalmente são equacionados em todas as relações horizontais e verticais que a
Administração Pública pratica.
Para compreender o conceito, precisamos de voltar atrás no
tempo e compreender o fator histórico das relações especiais de poder,
nomeadamente na distinção de ato administrativo e ato interno, e suas
consequências práticas.
Na Alemanha do século XIX fazia-se a distinção em ato
administrativo e ato interno, diferença essa manifestada principalmente na
vinculação do primeiro ao princípio da legalidade e afastando o segundo do
bloco de Juridicidade. Ora, afastando o princípio de legalidade na relação da
Administração Pública com os seus dependentes (trabalhadores da Administração
Pública, Professores, Militares, presos) permitia uma limitação dos direitos
Fundamentais dos mesmos face ao Estado, coisa que não era permitida para os
demais cidadãos.
Assim, era permitida à Administração comportamentos
lesivos/limitantes para os cidadãos vinculados ao Estado com um grau
elevadíssimo de discricionariedade, sem que a estes lhe fosse permitido
recorrer às instâncias jurídicas, mas apenas a instâncias administrativas, ou
seja, as relações especiais de poder entre Estado e subalternos era regida
pelos Regulamentos Administrativos, afastando a aplicação da lei.
Este conceito de relação especial de poder, ou de
sujeição, vem a ser afastado, por decisão do Tribunal Constitucional Alemão
1972, que vem considerar que os direitos Fundamentais devem ser respeitados nas
relações especiais de poder, submetendo-se ao controlo Jurisdicional. No caso concreto,
tratava-se de um preso alemão a quem foi violada a sua correspondência pela direção
do estabelecimento prisional, e a quem o Tribunal Alemão conferiu um direito
fundamental, apenas passível de limitação por lei.
Morre assim a conceção de uma relação especial de
poder, dividindo a doutrina em 2 modelos. O Primeiro modelo com a eliminação
total das relações especiais de poder, equiparando todos os cidadãos face aos
olhos da Administração, e um segundo modelo que aceita uma relação especial de
poder numa conceção mais fechada, que mantém uma regulação de alguns aspetos
chave como os direitos fundamentais, limitados ou não por lei.
Como nota adicional, é percetível que o Estado tenha
relações diferenciadas com cidadãos que a si estejam vinculados, e que é do
interesse Público que ao Estado sejam permitidos comportamentos mais agressivos
face a grupos específicos, como por exemplo o disposto no artigo 270º, que
afasta o direito à greve aos Agentes de forças de segurança, mas é pacifico afastar
daqui uma relação especial de poder exatamente porque este limite aos direitos
fundamentais dos cidadão respeita o princípio da legalidade.
Em suma, as relações especiais de poder, na sua conceção
clássica, acabam esvaziadas por uma consolidação dos direitos fundamentais,
permitindo a todos os cidadãos, subordinados ou não à Administração Pública, a
pautarem a sua relação com o Estado ao princípio de legalidade na total
amplitude de relações, horizontais ou verticais.
João Alcobia
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